Os modelos e processos de gestão que fizeram sucesso por 10, 20 anos, não são mais garantia de resultado futuro. O mundo viveu uma pandemia e os ambientes corporativos viveram uma disrupção, que impactou na vida de todos nós. A gestão de mudanças na atuação recente das áreas de RH precisou ter pensamento ainda mais moderno do que já vinha tendo. Precisou ser criativa e ágil para compreender o contexto do negócio, se conectar com as pessoas e oferecer as melhores soluções para cada caso. A transformação digital do RH foi amplamente acelerada nesses últimos anos. Entretanto, o desafio de equilibrar empatia, distanciamento e produtividade segue como mais um dos tantos, que os profissionais desta área precisaram viver e vencer.
Capacidades de entender o entorno e de se adaptar passaram a valer ouro para profissionais de todas as faixas etárias e áreas de formação. Não é que o mundo estivesse estático antes disso. Ciclos de mudança sempre existiram, mas os intervalos eram mais amplos e o tempo disponível para ajuste parecida mais elástico. Agora, com a aceleração das mudanças, os ciclos estão cada vez mais curtos e frequentes, demandando reinvenção rápida e constante. Como já dizia o filósofo Heráclito de Éfeso, em 500 A.C.: “nada é permanente, exceto a mudança”.
A pandemia trouxe à luz um termo que se chama mudança impositiva. No livro “HCMBOK®: O fator humano na liderança de projetos”, os autores Vicente Gonçalves e Carla Campos detalham que, em situações como esta, só há dois caminhos: adaptação ou extinção. “Um terremoto que destrói uma cidade ou a falência repentina de uma empresa são exemplos de mudanças que não podem ser geridas por um personagem central. Ocorrem de forma impositiva e a única alternativa dos envolvidos é a autogestão das mudanças”, analisam.
Na pandemia, os profissionais de RH precisaram rapidamente compreender o que já existia de pronto no mercado e que pudesse ser adquirido e adaptado. Passamos a fazer uso de ferramentas que permitissem comunicação segura no dia a dia e processos de avaliação que garantissem agilidade e transparência. Também muito se buscou avançar em mecanismos de pagamento de salário e benefícios mais flexíveis, que atendessem ao novo momento. Outra demanda que rapidamente precisou ser bem atendida foi em relação a instrumentos que favorecessem o apoio humano, fornecendo segurança psicológica, além de saúde física e mental, para viver aquele novo normal.
Foi necessário a esses profissionais também a tomada de decisão rápida, em relação ao que não existia pronto e que precisava ser artesanalmente construído. Como adequar as políticas internas? Como facilitar negociações com sindicatos e órgãos de classe? Como manter o engajamento dos funcionários com a empresa, o senso de pertencimento, as relações de confiança? Como ampliar a identificação com a marca, sem a presença física na empresa? Como garantir o compromisso individual com as entregas e os resultados do negócio?
A mudança impositiva pode ocorrer por uma força maior da natureza, uma mudança no contexto do negócio ou uma decisão própria da empresa. Neste último caso, quando a empresa adota a estratégia de atuar de maneira hierarquizada e com uso de autoridade no dia a dia, para fazer algo se cumprir.
É comum que a mudança impositiva dê origem a um automático impacto negativo. No caso da pandemia, toda a crise impactou o mundo de maneira única, provocando mortes, doenças, recessão e sérias questões sociais. Dentro de algumas empresas e setores, porém, foi possível enxergar um movimento não comum em mudanças impositivas. Talvez em função de lideranças que perceberam o momento único que estavam vivendo. E que conseguiram construir com suas equipes um forte senso de time, com apoio coletivo e engajamento para que bons resultados continuassem sendo atingidos. Mas, mesmo nesses exemplos de boa condução, incertezas também pairavam no ar. E incerteza, somada a medo, é um ingrediente potencial para colocar em risco o sucesso de um movimento de transformação.
Os macroprocessos recorrentes e tradicionais de um ciclo de Gestão de Mudança, descritos no HCMBOK®, foram fundamentais para manter rotinas básicas de trabalho, durante e após a pandemia. E tiveram que ser conduzidos mesmo que empiricamente pelas lideranças, com apoio da área de Recursos Humanos:
– Gestão da Comunicação;
– Formação do Espírito de Equipe e Realização de Dinâmicas de Reforço;
– Estímulo a Processos Participativos;
– Gestão de Conflitos, Motivação, Estresse e Comportamentos;
– Estímulo à Criatividade e Inovação;
– Gestão de Stakeholders.
Felizmente nosso cérebro é maleável, consegue se adaptar diante das novas circunstâncias, num conceito chamado de plasticidade cerebral. A ele se deve nossa capacidade de contínua aprendizagem quando já somos adultos. De viver novas experiências, receber novos estímulos e evoluir através de novas vivências. O fim da pandemia promoveu o retorno aos escritórios e à convivência presencial entre pessoas de uma mesma organização. Mas, ao retornarem, os profissionais não eram mais os mesmos internamente. Tinham vivido experiências e tiveram acesso a estímulos que provocaram neles novas percepções cerebrais do que valorizam enquanto indivíduos e profissionais.
Com isso, tem sido inevitável uma contínua e profunda reflexão dos líderes das organizações e das áreas de Recursos Humanos. Um repensar em relação à missão, aos valores e à atuação cotidiana na relação entre empresa e funcionários. A transformação cultural da sociedade tem gerado reflexo imediato nas estratégias de marca e de proposta de valor (EVP – Employee Value Proposition). As empresas querem e precisam se repensar para serem competitivas, atraentes e diferenciadas, de maneira a conquistar e reter os melhores talentos.
Como você acha que serão os próximos anos na forma de atuação do RH? Eu acredito que haverá uma contínua busca por evoluir e se posicionar com empatia, estratégia, qualidade e confiabilidade. Tanto na relação com as lideranças do negócio, como em relação às equipes. E acredito também que os profissionais de RH serão ainda mais estimulados a terem pensamento inovador e flexível, para atuarem em ambientes complexos e em constante transformação.
Ana Luiza Moraes Cassalta
Executiva de Gestão de Mudanças, Comunicação e RH
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